No ano de 2018, somente a cidade de São Paulo recebeu mais de 15 milhões de turistas, vindos de diversas cidades paulistas, estados brasileiros e países ao redor do mundo (SPTURIS, 2019). Mas o que essas pessoas fazem na cidade que nunca dorme?
Parte delas chega à São Paulo em busca de cultura e lazer e, dentro do eixo do turismo cultural, encontramos o turismo ferroviário. Não é surpresa para ninguém que a capital paulista tem uma extensa malha ferroviária e metroviária. Mas o que talvez não seja de conhecimento geral é como isso pode ser considerado turístico.
O município tem alguns roteiros temáticos e, entre eles, o chamado “O café e a história da cidade”. É nele onde encontramos quatro bens ferroviários tombados: Estação da Luz, Vila dos Ingleses, Estação Pinacoteca e Estação Júlio Prestes. A história da São Paulo tem tudo a ver com café, que tem tudo a ver com ferrovia.
O café chegou ao estado de São Paulo em meados do século XIX e foi ele o responsável por também trazer a ferrovia. A economia cafeeira desencadeou progresso e desenvolvimento, principalmente na capital, que começou a sofrer com a crescente populacional. Foi assim que a expansão ferroviária chegou à Região da Luz. A Estação da Luz, administrada pela empresa inglesa São Paulo Railway, foi inaugurada em 1901 com o objetivo de escoar a produção de café do interior paulista ao Porto de Santos. Junto com ela veio a Vila dos Ingleses, concebida para abrigar os funcionários ingleses da São Paulo Railway. Outra empresa presente na cidade era a Estrada de Ferro Sorocabana. Ela administrava a, hoje chamada, Estação Pinacoteca, que abrigava seus escritórios administrativos e Armazém Central, e que também serviu como estação provisória até a inauguração da Estação Júlio Prestes. As plataformas da Júlio Prestes foram inauguradas em 1930, mas sua construção terminou apenas em 1938 (SPTURIS, 2012).
Com a Crise de 1929, o estímulo de Getúlio Vargas às rodovias e a iminência da 2ª Guerra Mundial, a economia cafeeira entrou em declínio e, com ela, a Região da Luz. Ali foi inaugurado um terminal rodoviário, que estimulou o comércio e a passagem de pessoas, mas que, quando transferido para a atual Rodoviária do Tietê, na década de 1980, esvaziou o bairro. Assim, aumentou o número de pessoas que faziam uso de drogas no local, surgindo o que conhecemos hoje como Cracolândia. Na década de 1990, com o objetivo de transformar o bairro da Luz em um polo cultural, alguns espaços foram construídos ou reformados. Entre eles estão a Sala São Paulo, na Estação Júlio Prestes; o Museu da Língua Portuguesa, na Estação da Luz; e a Estação Pinacoteca, que abriga o Museu da Resistência (DEUS, 2019).
Apesar de espaços tão importantes para a história de São Paulo e de, hoje em dia, ainda serem símbolos do município, como a Estação da Luz, por exemplo, apenas quatro bens ferroviários são considerados atrativos turísticos e estão em somente um roteiro. Mas por quê?
Vários pontos podem explicar. Primeiro, é necessário saber se há interesse de quem está planejando o turismo em São Paulo em preparar e divulgar o atrativo para receber turistas. Os planejadores acham o patrimônio ferroviário importante? Por serem bens tombados, logística e financeiramente, é mais difícil incluí-los em roteiros turísticos?
Outro ponto relevante é que os bens mais relacionados ao patrimônio ferroviário são as estações de trem e elas são extremamente cotidianas para o paulistano, uma vez que os trens são utilizados como meio de transporte para o trabalho e lazer. Isso pode diminuir a importância dada a eles. O morador pode não querer utilizar o patrimônio ferroviário com foco no lazer e o turista pode não ter interesse em conhecer algo que faz parte do dia-a-dia do paulistano.
Essas questões são amplas e algumas ficam em aberto, mas podem servir de tema para pesquisas futuras. Tudo o que foi trazido mostra a importância de se estudar o patrimônio ferroviário e que, mesmo dentro da perspectiva do turismo, ele pode explorado por diferentes aspectos. Além disso, ressalta a importância do planejamento. Quando se planeja, é necessário entender o lado dos gestores, do que eles consideram importante e viável. Porém, também é preciso levar em consideração as vontades do turista. Encontrar um meio termo entre eles é fundamental para que uma cidade como São Paulo aproveite o máximo que o patrimônio ferroviário pode oferecer.
Referencias
SÃO PAULO TURISMO (SPTURIS). Observatório de Turismo e Eventos da Cidade de São Paulo. São Paulo: cidade do mundo – Dados e fatos dos eventos, viagens e turismo na capital paulista. 2019. Disponível em: http://www.observatoriodoturismo.com.br/pdf/DADOS_FATOS_2019.pdf.
SÃO PAULO TURISMO (SPTURIS). O café e a história da cidade. 2012. Disponível em: http://cidadedesaopaulo.com/v2/wp-content/uploads/2017/04/El_Cafe_y_la_Historia.pdf.
DEUS, Júlia Moreira de. Estação Júlio Prestes: critérios de atratividade aplicados a um patrimônio ferroviário ativo. 2019. 78 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Turismo) – Campus de Rosana, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Rosana, 2019. Disponível em: https://drive.google.com/open?id=1pQHPwjC9ThD18kFKoCvEmuRpontaw8RK
Como citar
DEUS, Júlia Moreira de. Turismo ferroviário na cidade de São Paulo: é possível?. Projeto Memoria ferroviaria, 2020. Disponível em: https://memoriaferroviaria.rosana.unesp.br/?p=3661
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